Encontrei-o, encardernado a carneira, ornada a lombada com filetes a ouro, um livrinho modesto dedicado e por isso chamado «Os amores e os ciúmes e a graça de Camilo». Foi publicado no ano terrível de 1939, em que a II Guerra Mundial começou. O autor, António Cabral, hoje ignorado, começou com o «Ó Fábia que foste Fábia», uma peça em três actos e seis quadros, em verso , representado pelo curso do 5º ano jurídico de 1885, e continuou com uma série de outras singelezas. Há pouco nesse livro que se leia, depois da frase com que ele abre, o bilhete que Camilo Castelo Branco escreve, pelas dez da noite de 22 de Novembro de 1886, antes de morrer: «A minha vida foi tão extraordinariamente infeliz que não podia acabar como a da maioria dos desgraçados. Quando ler este papel, eu estarei gozando a primeira hora de repouso. Não deixo nada. Deixo um exemplo. Este abismo a que me atirei é o terminus da vereda viciosa por onde as fatalidades me encaminharam. Seja bom e vituoso quem o puder ser». Camilo matou-se, o suicídio uma evasiva. A ideia era nele obsessiva. Perto do Natal do ano anterior escreveu a Trindade Coleho: «Conto com pouca vida; e, se não a encurto, é porque me custa a deixar um filho que lucra alguma coisa com a minha vida». Um dia, evadiu-se do cárcere.