«Receoso e susceptível», assim nos viu, como povo, Miguel de Unamuno, um «povo triste mesmo quando sorri», uma Nação de gente «mais apaixonada do que sentimental». Enfim, «um povo de suicidas».
É a paixão que traz aos portugueses a vida e os atira para a morte.
Suicidou-se Herculano por isolamento, Camilo e Antero, a tiro. Os nossos grandes vultos são grandes condenados. Os menos corajosos estiolam-se. Suicidas os que matam e os que morrem. Suicida Buíça ao matar Dom Carlos, suicida foi o Rei.
Impossível ler Unamuno e não ir ler Manuel Laranjeira, esse extraordinário neurasténico, médico, que por isso tão bem se conhecia e nos conhecia. Impossível dele não vincar a frase «em Portugal todos temos os olhos vestidos de luto por nós mesmos».
Laranjeira e Unamuno encontraram-se casualmente em Espinho no dia 8 de Agosto de 1908. Duas almas trágicas, a do português analítica, o espanhol paradoxal. Recordo-vos de Laranjeira a perplexidade que me arrancou o seu estudo sobre a santidade como patologia, o misticismo como doença, o êxtase como terapia; o carinho que devotou à «Cartilha Maternal» de João de Deus. Mas quero recordar-vos sobretudo o que foi a sua dolorosa experiência sentimental, a sua «Augusta», modesta, plebeia, mas fonte de seus amores e causa de suas angústias. Inadaptado aos erros do coração, Laranjeira sabia que «o amor quando o não matam, morre, e morre como uma tarde de Setembro». Leio no seu Diário Íntimo. «Sou uma natureza violenta, silenciosamente violenta – que é a pior maneira de se ser violento», escrevera a António Carneiro, pintor. Violentou-se. Também com um tiro na cabeça, em 22 de Fevereiro de 1912. «Decididamente isto há-de acabar mal», confidenciara a Amadeo de Sousa Cardozo. Tinha então 34 anos.