Eugénio de Andrade deveria detestar António Botto como poeta e por isso escreveu: «como poeta desde há muito que o tenho em pouca conta». Eduardo Pitta, que organizou o volume das Canções, lembra isso e lembra mais: que quando escreveu aquilo, ele ainda não era Eugénio de Andrade, mas sim «José Fontinhas». E para que o leitor perceba bem acrescenta, em nota de rodapé, que José Fontinhas é o «nome civil do poeta Eugénio de Andrade».
Ficam quites, pois, Andrade e Pitta e o leitor, basbaque, a ver.
Ah! Esquecia-me: ainda a propósito do brevíssimo apontamento biográfico que faz sobre o autor do poema «Ama sim, mas não obrigues a alma», diz Pitta que Botto, «homossexual assumido» acabaria erradicado do funcionalismo público, onde teria «modesto emprego», em 1942, «num tempo em que os mecenas não punham Fundações aos poetas».
Ora aí está a piadinha assassina! Atirado Fontinhas ao chão, há que pôr-lhe o pé no pescoço. O tiro de misericórdia vem a seguir. Citando-a à obra de Fontinhas enquanto Andrade, ressalva Pitta: «pese a admiração que por ela nutro».
Naturalmente, nem seria preciso dizer, porque o leitor nesta altura já está esclarecido quanto a ser imensa a admiração.