Consegui ontem, por viajar de comboio, iniciar a leitura do Marcovaldo, o livro de crónicas do Italo Calvino. É uma história abstracta vivida num mundo demasiado concreto. O leitor segue o percurso de uma insignificante folha de árvore, soprada pelo vento, acompanha a sua errática trajectória, antecipa o momento que, torneando o pára-brisas de um automóvel, é sustida amigavelmente pela intersecção de uma esquina de parede e uma corda esticada para estender roupa. Os figurantes neste teatro rústico vivido em ambiente citadino têm todos nomes grandiloquentes, clássicos, greco-latinos. A Itália é uma criatura recente, a língua italiana precede-a criando uma Pátria cultural antes de haver uma Nação de cidadãos. Leio Calvino, essa babel linguística magnífica, no original, allegro cantabile, vivace, con brio.