Há o hábito de dizer contemporâneo quando se quer dizer mais do que moderno. O vício vem da História que no meu tempo de liceu se classificava em Antiga, Moderna e Contemporânea e ainda havia a Pré-História, como se fosse uma espécie de pré-vida.
Vem isto a propósito do Ruben A. Gostaria de ser capaz de ler os volumes todos das Páginas, mas estou devorado pelas obrigações e diminuído pelas desilusões e é um livro que exige que se esteja livre e se possa ficar contente.
E vem a propósito porque o Ruben A. trouxe-nos uma modernidade na forma de escrever que os seus contemporâneos desconsideraram, recusando a mudança. Com ele a contemporaneidade foi antes da modernidade. Impossibilitado de escrever em progressão paralelizou com o romance Caranguejo. E disse: «tudo que é novo em Portugal precisa de ser arranjado, então as canalizações já são construídas entupidas de nascença».
Detestaram o modo de escrever e a tal ponto do desdém que a coisa meteu autoridades públicas, entidades oficiais e o próprio Presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar.
«Eu sou sempre mais moderno do que eu. Sinto-me aos saltos espirituais num rebolar peripatético. Quero escrever as aventuras do Cavaleiro de Barbela». E escreveu mesmo, em 1964 barrocamente desconcertante.
Correram-no então de lugares oficiais. Com o 25 de Abril fizeram-no Director-Geral e outras coisas públicas, com pouca convicção de ambos. Mas ele tinha escrito: «a vida pública ou semipública cria-me caspa. Para se realizar é preciso não participar dos serviços públicos ou municipalizados». Abriu excepção para si próprio, o que é uma forma triste de uma regra ser quebrada.
Ficou um extraordinário escritor, capaz de escrever às cores.