sexta-feira, 11 de agosto de 2006
A felicidade menor
Ainda consegui ler ontem uma conferência que o Jorge Luis Borges fez na Universidade de Belgrano, em 1979, dedicada ao livro. Trata-se de um ensaio erudito, o livro visto por alguns clássicos, mas que é sobretudo um contraponto entre a forma escrita e a forma oral. O livrinho, onde vem essa conferência e outras quatro chama-se, aliás, «Borges Oral». Nela, o seu autor diz que reler é mais importante do que ler e precisamente para vir aqui deixar esta nota, reli esta manhã o que ontem lera. E que ficou? Por um lado que «se lemos um livro antigo é como se lêssemos todo o tempo que decorreu desde o dia que foi escrito para nós», por outro que «uma forma de felicidade é a leitura; outra forma de felicidade menor é a criação poética, o que chamamos criação, que é uma mistura de esquecimento e de recordação do que lemos». Claro que eu transpus isto para o modo de estar com os outros, para o folhear no outro cada interstício do corpo e cada recanto da alma. Li pois e reli e descobri assim a infelicidade das páginas em branco e de um tempo decorrido em que nada conseguimos ler. Por isso a felicidade menor desta escrita.