domingo, 14 de maio de 2006
Cada criatura humana
Continuo a ler os «papéis avulsos» do Machado de Assis, onde descobri que «cada criatura humana traz duas almas consigo: uma que olha de dentro para fora, outra que olha de fora para dentro». A observação é interessante, a consequência sinistra. No caso, fardado o homem de alferes, o alferes eliminou o homem. Bem podia a patusca tia Marcolina, inconsolada viúva de capitão, embeiçada pela farda, abraçá-lo, achando-o, deleitada, uma bonito rapaz, e jurar, ambígua, que não havia em toda a província outro «que lhe pusesse o pé adiante». Achando-o sozinho, «nenhum fôlego humano em redor», enfim, «entre galos e galinhas tão-somente, um par de mulas que filosofavam a vida, sacudindo as moscas, e três bois», despido enfim de alferes, o homem descobriu, pela alma interior, que a melhor definição do amor «não vale um beijo de moça namorada».