Curiosa não é esta circunstância, sim o que se lhe seguiu.
segunda-feira, 10 de junho de 2024
Os Lusíadas: a história de uma grande viagem
Haverá muitas formas de lembrar Camões, no dia do ano que lhe é dedicado e que já foi de muitas outras coisas.
No meu caso, foi a ler, neste fim de tarde, a curiosa narrativa que o bibliófilo José Vitorino de Pina Martins levou ao seu interessantíssimo diria eu, autêntico livro de viagens, que fez em redor do mundo dos livros e que intitulou Histórias de Livros para a História do Livro e que a Fundação Gulbenkian editou em 2015.
Vem ao caso a troca que fez, numa quarta-feira da primavera de 1963, com um livreiro antiquário norte-americano, de um clássico que enriquecia a sua vastíssima biblioteca, o "Epigrammata antiquae Urbis", publicado em 1521, pela edição de 1613 dos Lusíadas, comentada por Manuel Correia que de há muito desejava.
Curiosa não é esta circunstância, sim o que se lhe seguiu.
Curiosa não é esta circunstância, sim o que se lhe seguiu.
Já possuidor da notável obra do nosso vate, acabou por trocá-la, ainda em Lisboa, por um livro de Erasmo de Roterdão, outra das suas predileções.
Só que a história não acaba aqui.
Um dia, em Paris, depois de ter percorrido os alfarrabistas desde a Place de la Sorbonne até ao Cais do Sena, e eis que Pina Martins encontra, mal encadernado em pele encarquilhada e poeirenta, uns Lusíadas da mesma data e com o mesmo comentador.
Pensava o apaixonado cultor das Letras que este faria as vezes daquele outro que fora, embora por pouco tempo, o seu. Enganava-se, porém.
Folheando-o, à noite, no quarto do hotel, já de pijama vestido, uma nota a lápis, com a a alusão a Sá de Miranda, a propósito do verso "Mas um velho de aspeito venerando", afinal o do Restelo, fez irromper a verdade: não era um outro em vez do que fora seu, era o próprio que fora seu.
A obra tinha viajado da América para Lisboa e daqui, sabe-se lá como, para Paris.
«Os caminhos que os livros percorrem!», comentou, o nosso autor. «Em última análise, os livros, como os homens, cruzam os países, os continentes e os oceanos. Ser-me-ia grato, porém, sublinhar que, companheiros dos homens que os amam, eles também procurar aqueles que com eles conversam. Objectos nobres por excelência, concebidos e realizados pelo génio humano, são eles que nos procuram, são eles que nos encontram e neles podemos ter sempre a certeza de descobrir uma palavra de conselho, de advertência e de amor!», concluiu.
Fico por aqui. Celebro Luís Vaz de Camões por esta forma.