sábado, 2 de fevereiro de 2008

Trama

Tinha prometido que o faria e hoje arranjei uma nesga de tempo para o fazer. Fica na Rua S. Filipe Nery, ao Rato, a rua que se sobe ladeando os correios, onde era o velho armazém da Livraria Almedina. Em 1981 fui lá ver chegar, vindo da tipografia, o meu livro de processo penal, impresso na Tipografia Lousanense. É uma livraria, uma aposta jovem. Chama-se Trama.
Fico sempre com o coração apertado cada vez que entro numa nova iniciativa que tenha a ver com livros, imaginando a dificuldade quantas dificuldades há em vingar um empreendimento cultural.
Encontrei um livro que não conhecia, alguma «correspondência» entre o Jorge de Sena e o Vergílio Ferreira. Logo a propósito, a abrir, uma carta do autor do hoje desaparecido «Mudança», escrita em 5 de Fevereiro de 1950, a pedir que lhe comentasse, em crítica, o livro que editara a expensas próprias. É tocante: «rasamente e miseravelmente lhe confesso, portanto, que desejo a discussão para vender o livro. Diabo, seis contos é peso desconforme para o orçamento de um funcionário público».
No último dia desse ano, Sena pedia-lhe, em carta: «e agora posso pedir-lhe um favor que V. fará se puder ou quiser? Esta edição obriga-me à venda certa de uns tantos exemplares. Vê V. possibilidade de me colocar alguns aí em Évora?». Em 4 de Janeiro, chegava-lhe a desanimadora resposta, vinda da Rua Mesquita, n.º 28: «só lamento não descobrir posibilidades, ao menos para já, de colocar alguns exs., isto porque o mercado das minhas relações está saturado pelas frequentes vendas no género. Versos, romances, desenhos, tudo me tem vindo bater à porta, nestes tempos de futebol e de crise».
Hoje, outros Senas, outros Vergílios Ferreiras, escrevem cartas assim, «nestes tempos de futebol e de crise».