quinta-feira, 9 de abril de 2009
O triálogo
Em 1951, quase a deixar o seu lugar de leitor do King's College, Ruben A. escreveu uma peça de teatro chamada Triálogo. Lia-a agora, enquanto esperava por uma boleia que ainda não chegou. A narrativa é surreal, «absurdismo surreal em sátira culta» lhe chamou o prefaciador da edição da Assírio & Alvim, onde vem publicada, burlesca diria, com Camões, sim o Luiz Vaz, agora feito burocrata e apoquentado com os despachos, «coisas sem interesse, quadras populares, jogos florais, admissões de serventes e contínuos», mais Uma Velha Lady Inglesa que faz de si marido, julgando-se viúva quando, di-lo ele, «juridicamente» - ah! risos - está apenas «hipotecada» e, Pirandello puro, o próprio autor «convertido em personagem».
Ri-me, sim, com gosto e vontade de rir. E a minha boleia sem vir.
É que há, entre tanto riso, aquele momento em que está lá fora a personagem que quer entrar em cena, o inesperado, o director da agência Nini, sequioso por conhecer o Épico e dele obter uma fala, uma conversa, uma entrevista; mas não, não entrará, porque, remata o Ruben A., actor em cena, «o tipo não pode aparecer porque nesta peça só há três personagens falantes e além disso eu não quero que ele apareça. Tira todo o interesse ao nosso triálogo».
E pronto, eis assim, talqualmente, a paródia, mas não só, pois há mais! Há uma possibilidade, lógica, abstracta, mas cenicamente possível, que o teatro é o domínio da liberdade à solta: ele poderia ser o outro, um qualquer, por exemplo o marido de Madame. Porquoi pas?
Mas oh! Uma Lady Inglesa só poderia, caprichosa, dizer com esta diz: «Não quero que seja meu marido. Era desagradável para ele saber que o tinha esquecido. Não convém que seja o meu marido. Proponho que não seja o meu marido».
Ora! E assim ficou: «Então está bem, estamos todos de acordo que o homem que está lá fora não é o seu marido nem mesmo que ele queira», diz Ruben A., magnífico!
É a risota geral, em todo o teatro até na geral, o curral dos que seguem de pé, aninhados pela arte e pelo bilhete baratucho. Aplaudo em pé! A minha boleia chegou.