domingo, 12 de junho de 2011
O Profeta de Portugal
Toda a Literatura está aberta à hermenêutica. Muitas das entrevistas a escritores são na base da reconstituição do sentido, do significado, do propósito das alusões, até do nome das personagens. Na Literatura profética isto amplifica-se, por ser essa a sua natureza e a intenção de quem a produz. É o caso das trovas do "sapateiro de correia" Gonçalo Annes, o Bandarra. Encontrei precisamente em Trancoso uma edição de 2001 - e tantas outras lhe preexistiram - com notas e texto de apresentação de Fernando Santos Costa. Citando Fernando Pessoa quando afirma que é ele o verdadeiro patrono do nosso País, o compilador lembra que foi o seu retrato o que foi afixado quando da aclamação de Dom João IV. Julgado em 1541 pelos torcionários do Santo Ofício da Inquisição, em 1665 ainda era proclamado édito a excomungar quantos lessem a sua obra. Acusado de ser judeu pelos do Palácio de Estaus, livrou-se por pouco da fogueira, mas não do humilhante desfilo de sambenito vestido e vela na mão. Com este livro percebi que a história do anti-judaísmo está ainda por escrever. Com Dom Afonso IV os judeus em Portugal - que se conheceriam como a "gente de nação" - estavam ainda obrigados a usar uma estrela amarela no chapéu. Adolfo Hitler apenas lhe mudou o lugar de afixação.